Eu não te quero humilde na minha cama, eu te quero arrogante e competente, imagina-me como se eu fosse uma câmara municipal e tu o meu presidente.
Estou de olhos postos no céu, aguardando o momento em que um dos aviões, vindo de longe, sobrevoará a minha casa com o meu presidente a bordo. O mês está prestes a acabar e ele raramente falta à sua visita aos meus aposentos. Paris pode estar distante da minha casa, mas os aviões têm asas, e eu, aqui, no chão coberto de relva verde, observo a tarde a se desfazer em tons dourados enquanto o sol começa a se pôr. Não é um combate de fogo contra fogo, corpo contra luz intensa; eu vejo-o e ele vê-me. Se isso é estar perdida em pensamentos, então o meu presidente faz valer a pena essa perda, pois, na verdade, só me perco em pensamentos por ele.
Às quatro da tarde, as plantas na rua abaixam suas folhas queimadas, cúmplices dos raios do sol, e o calor começa a se dissipar. A sombra fresca avança amigavelmente até minha varanda, e eu vejo o suor escorrendo pelo meu seio, enquanto os primeiros suores fortes começam a se fazer sentir.
- Já és uma mulher. Dezasseis anos, mas mulher - afirma a minha mãe, observando-me atentamente do terraço, nos seus momentos de descanso.
- Mulher de dezasseis do presidente.
- Mas ausente.
- Quando vem, é meu, só meu. Respondi a ela para ficar a doe-la por dentro.
A cara de insatisfação da minha mãe revela que ela não aguenta mais ver-me feliz por mais de vinte e oito dias, expectante e ansiosa, aceitando a ausência do presidente e esperando por ele no último dia do mês, para o que um homem ocupado possa fazer em um oceano profundo de uma cama.
- Tu precisas é de estudar, aproveitar a vida e ser uma mulher completa enquanto os teus atributos físicos ainda atraem os homens.
- O meu presidente nunca se afastará de mim. Veja estas pernas, veja este rosto, veja estes lábios, veja o meu corpo.
- Respeita-me, menina, respeita-me.
- O respeito deveria ter aparecido naquela estrada, quando aceitaste boleia do presidente. Ou queres que te bata?
A minha mãe apenas observa, enraivecida e impotente diante da sua filha, sem poder fazer nada. Então decide continuar a limpar o sótão, um espaço sem luz e ventilação, com pó e um cheiro de animal que ela conhece, mas cujo nome lhe escapa. Empurra a porta, bate com força, mas nada faz a porta abrir. Decide descer e chamar o segurança para ajudar a abrir a porta e possibilitar a limpeza do sótão.
- Senhor Benjamim, há uma porta no sótão que não abre, podes ajudar-me?
- Não te foi autorizada a entrada lá e nem a limpeza. Por isso, não vás ao sótão, é proibido.
A curiosidade da minha mãe aumenta ao ouvir a proibição do segurança. Então, provavelmente, ela irá preparar o jantar. É o dia do jantar especial, o dia da chegada do senhor presidente à casa, um mês depois da sua partida, um mês depois de celebrar os dezasseis anos de Felismina. O guarda terminou de arejar a varanda e aparar a relva dos jardins à frente da casa, e Felismina já se recolhera para um banho demorado antes do jantar. Ela precisava estar às oito em ponto na mesa quando o presidente chegasse. Enquanto escrevo este diário, lembro-me que preciso me vestir depois do banho, estar bem cheirosa para o presidente. Como já mencionei, tomei um banho de sol e observei o céu, esperando ver algum avião com o meu presidente.
Nesta noite, vestirei uma blusa decotada, deixarei meus cabelos soltos e usarei a lingerie que aprendi a escolher com base nas preferências do presidente. Quero surpreendê-lo, encantar cada fibra de seu ser. Esta noite, nosso colchão se transformará em um oceano profundo, onde a paixão e o desejo se entrelaçarão em acrobacias e segredos.
Esta noite não será apenas mais uma; será uma noite como nenhuma outra, imersa em uma escuridão densa e intensa, onde nossos corpos e medos se fundem em um abraço desesperado. O meu presidente deve reafirmar seu domínio, colocar os ímpetos da minha mãe no lugar que lhe é devido. Não aceitarei dividir um homem de tamanha influência com alguém tão próximo a mim. Minha mãe é um vínculo pessoal, uma presença que não pode ser compartilhada com um político. Ela é exclusivamente minha, e eu me recuso a permitir que ela se torne uma peça em um jogo de poder.
- Acho que estou certa - afirma Felismina para si mesma, enquanto veste calças de fazenda azul-marinho, justas ao corpo, com um fecho fino que, ao ser fechado, une a fazenda de uma só vez, acentuando a escultura do corpo e provocando desejo a qualquer santo recém-canonizado.
- Felismina, chegou o presidente - anuncia a mãe, com a boca na porta do quarto. Felismina termina de se arrumar e vai encontrar o presidente.
Ao entrar na sala, ela se depara com uma cena que supera todas as suas expectativas. O ambiente está repleto de objetos que evocam um desejo visceral e incontrolável: cintos de couro negro, chicotes com pontas de couro macio e sedutoras, velas vermelhas e douradas espalhadas estrategicamente, lançando um brilho suave e erótico sobre o espaço. A mesa está coberta com uma seleção de masturbadores de texturas variadas e símbolos fálicos imponentes, que se destacam em suas formas robustas e provocativas. Cada detalhe foi meticulosamente colocado, criando uma atmosfera carregada de promessas e tentação.
-presidente, seu safadinhu, viajadol. Reclamava ela.
A sala parece pulsar com uma energia sensual, uma coreografia de desejo e dominação, onde o sussurrar das velas e o cheiro de cera derretida se misturam com a expectativa palpável no ar. As texturas e formas dos objetos são um convite irresistível para uma noite de exploração e prazer, onde cada elemento é uma promessa de satisfação intensa e inigualável.
-Você não é homem você é um avião que voa no meu corpo, uchiii. Reclamou a Felismina mais uma vez.
Ela engole em seco, sentindo o desejo e a ansiedade se entrelaçarem dentro dela. Este cenário não é apenas uma visão; é uma declaração explícita do tipo de prazer que o presidente deseja explorar com ela. Com os olhos arregalados e o coração acelerado, ela sabe que esta noite será uma celebração de todos os sentidos, uma jornada através de limites e fantasias que desafiarão sua compreensão de prazer.
- Uii, querido, não precisava disso, eu te quero para sempre.
- Não é para ti.
- Para quem é então?
- Para a tua mãe, ela sofre tanto por nós e por ela, por isso são brinquedos dela.
- Não, não, eu fico com isso, para ela não. Ela já não tem idade para essas coisas, está velha e inutilizada.
O guarda no corredor ouve essas palavras e sorri. O presidente também sorri, e a mãe de Felismina, na cozinha, também ouve e chora.
Naquela noite, eu e o presidente jantamos agradados, alimentando-nos mutuamente e, depois, todos se ausentaram, deixando-nos sozinhos até às onze da noite, bebendo vinho e dançando kizomba. Perguntei-lhe o que é mais importante para um homem.
- O que é importante para um homem que quer estar sempre preenchido?
- É estar com uma mulher, de preferência uma linda mulher!
- E eu, preencho essa vaga que dizes?
- Tu estás a crescer rápido.
Quando ele respondeu daquela forma, uma desconfiança começou a brotar em mim. Talvez a minha mãe tivesse razão.
- Deverias estudar, eu não sou capaz de preenchê-lo. São as questões que fazia e a minha cabeça começava a se encher de dúvidas.
- Então vamos deitar-nos e eu te mostro se preencho ou não.
Ele sorriu, como uma criança saboreando sua papa. E fomos para os meus aposentos. Por momentos, comecei a duvidar de mim mesma, achando que sou muito nova para estar com um homem tão experiente, mas ele é a medida dos mais novos sonhos, um gigante na terra pequena do resto do mundo.
Na madrugada, nos entregamos intensamente um ao outro. Depois do dia dos meus dezasseis anos, estava sem medo e com vontade de fazer do meu tubarãozinho o meu peixe favorito. As roupas caíram ao chão, o batom perdeu seu tom, e nos abraçamos, fazendo o que outros fazem. A noite tombou sobre nós, tentando de várias formas. O sexo só é bom quando a selvajaria se combina com um toque calmo e romântico que agrada uma mulher. O meu presidente adormeceu. E escreve um poema com titulo: -oh, my presidente durminhoku.
- O que aconteceu em Paris que te deixou tão cansado, meu amor?
- Muitas reuniões privadas.
Sou mulher e logo pensei que tipo de reunião privada pode esgotar um homem a ponto de impedi-lo de retornar à ação após o primeiro combate. Olhei para o seu corpo franzino, mulato, mas quando está disponível, é formidável no nosso oceano macio de cama. De repente, surgiram alguns pensamentos trazidos por suas próprias palavras quando decidi ser um pouco humilde. Toquei-lhe nas costas, ainda com vontade de repetir aquilo muitas vezes, tenho dezasseis anos.
- Eu não te quero humilde na minha cama, eu te quero arrogante e competente, imagina-me como se eu fosse uma câmara municipal e tu o meu presidente.
Minhas palavras não desanimaram o meu presidente do sono profundo, mas ao se virar de costas para a parede, ele disse:
- Então votas em mim.
Isso irritou-me ainda mais por não ter conseguido trabalhar durante a noite. Deitei-me e adormeci irritada.
Alguém entrou no sótão, movendo-se furtivamente na penumbra. A única luz que iluminava o ambiente vinha de uma lanterna fraca que piscava intermitentemente, lançando sombras distorcidas pelas paredes do sótão. Com um pé de cabra enferrujado, forçou a porta pesada e a abriu com um ranger sinistro, um som que parecia ressoar no silêncio opressivo da casa. O ar estava carregado de poeira e um odor azedo de humidade antiga, como se o sótão guardasse segredos há muito esquecidos.
Dentro, a atmosfera se tornou ainda mais densa. A mulher com a vassoura na mão, tentando limpar o espaço proibido, mal teve tempo para reagir. Uma presença obscura e silenciosa se lançou sobre ela, os olhos grandes e brilhantes se destacando no escuro como lanternas sinistras. Sem um som de aviso, a porta foi fechada com um estrondo seco, imergindo o sótão em uma escuridão quase palpável.
O que se seguiu foi uma batalha silenciosa, um tumulto de movimento e choque sem qualquer som discernível. A luz da lanterna piscou uma última vez antes de se apagar, mergulhando tudo em um breu absoluto. O único indício do que ocorria era o sussurrar abafado e o arrastar de objetos pesados, uma luta desesperada que parecia durar uma eternidade.
Então, tudo parou de repente. O silêncio que se instalou era tão denso e pesado que parecia ter massa. A casa, outrora viva com os ecos das atividades diárias, ficou envolta em um silêncio profundo e inquietante. O escuro parecia se estender por cada cômodo, mais opressivo do que qualquer sombra que se pudesse imaginar, mais mortal do que o mais absoluto dos calafrios.
Os grilos, que antes cantavam sua canção de fundo, haviam desaparecido, deixando apenas a sensação de um vazio absoluto e um presságio de algo sinistro. A casa, agora um abismo de escuridão, aguardava pacientemente o que viria a seguir. Algo terrível havia acontecido no sótão, e o medo palpável parecia respirar junto com os habitantes da casa, prometendo que nada seria como antes. O próximo capítulo se escondia nas sombras, um enigma esperando para ser desvelado.
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