O que é inovador em Portugal já está ultrapassado em outros lugares, e o que é antigo lá é visto como inovação em nossa terra
Estátuas de Pedra, Orgulho de Papel
Na serenidade das tardes, enquanto o vento sussurra segredos e os mokeiros da minha rua saboreiam o grogue com um certo estilo, sinto que cada gole é uma pequena derrota para o meu país. Quantos grandes homens caíram e se tornaram ícones, e quantos outros, mesmo em queda, mantiveram-se firmes, merecendo a eternidade em bustos e estátuas? Esse emaranhado de sentimentos carrega o peso da nossa história sobre os ombros da nossa terra.
Cada estátua e busto erguido parece ser um prenúncio de nossos desejos e frustrações, um reflexo de um orgulho nacional que ainda busca se firmar. Onde reside a essência desse orgulho? Talvez numa medalha conquistada, rapidamente esquecida, talvez até o próprio corpo do herói que a conquistou nos jogos de paris. T.S. Eliot escreveu: “Não paramos de explorar e, no fim de toda a nossa exploração, chegamos ao ponto de partida e conhecemos o lugar pela primeira vez.” Em nossa incessante busca por identidade e honra, retornamos constantemente ao início, questionando o que significa realmente ser cabo-verdiano.
Após tantos anos de independência, é justo que ainda não tenhamos símbolos verdadeiramente grandiosos de orgulho nacional? Amílcar Cabral, por exemplo, é um tema nacional controverso. Seu papel na história é amplamente reconhecido, mas sua figura, às vezes, parece alheia às diversas correntes da nação. Deve-se à própria democracia que este sentimento persista? A instabilidade dos símbolos nacionais reflete a realidade do país, onde muitas gerações imigrantes adaptam-se cultural e ideologicamente ao novo país, favorecendo sua cultura ao invés da origem, provavelmente. Com o tempo, muitos tornam-se mais próximos das ideologias e modos de vida do país de acolhimento, mesmo que ainda mantenham uma lembrança da terra natal.
É curioso notar que muitos cabo-verdianos frequentemente fotografam mais estátuas de figuras estrangeiras, como Eusébio, o futebolista português, do que a estátua de Amílcar Cabral, o líder revolucionário cabo-verdiano.
Comparativamente, Eduardo Mondlane, líder da luta pela independência de Moçambique, tem suas estátuas em Maputo visitadas e veneradas com um orgulho evidente. Isso pode parecer um erro, mas é uma reflexão sobre como o orgulho nacional e o amor pela pátria podem se manifestar de maneiras diversas. É estranho ver a adoração a símbolos de outros países enquanto nossos próprios símbolos são muitas vezes negligenciados. No entanto, é importante respeitar o apego a esses símbolos, mesmo que sejam de fora.
Ainda assim, temos marcos significativos, muitos dos quais foram introduzidos pelos colonizadores portugueses. A independência deveria ter sido nossa oportunidade para reescrever a história com um orgulho genuíno, como afirmou Maya Angelou: “Eu me levanto, eu me levanto, eu me levanto.” Nossa jornada deveria ser um testemunho de nosso despertar e afirmação.
No entanto, estamos presos em um ciclo repetitivo. O que é inovador em Portugal já está ultrapassado em outros lugares, e o que é antigo lá é visto como inovação em nossa terra. William Faulkner disse: “O passado nunca morre. Nem sequer é passado.” Apresentamos essas condições com um orgulho questionável, celebrando o que deveria ser um avanço como se fosse um retrocesso. Dançamos ao ritmo de uma música que já não nos pertence, mas da qual não conseguimos nos desvincular.
Michel Foucault nos lembra que “A história é uma construção do presente.” Em nossa busca por símbolos que representem nossa identidade, moldamos o passado para se ajustar às expectativas atuais. Isso cria uma desconexão entre o que realmente somos e o que escolhemos lembrar. As estátuas, então, tornam-se marcos de um esforço para capturar um espírito que talvez nunca tenha sido verdadeiramente capturado.
Nos últimos tempos, silhuetas, os bustos e estátuas espalhados pelas ilhas têm sido objeto de debate. Alguns são justos e merecidos, outros parecem meras formalidades. O problema não está na existência desses monumentos, mas na nossa compreensão deles. Em Cabo Verde, os bustos e estátuas frequentemente parecem uma obrigação cumprida, não uma expressão genuína de devoção e reconhecimento. A celebração do centenário de Amílcar Cabral, por exemplo, só ganhou relevância após a iniciativa da fundação que leva seu nome, refletindo a distância entre a homenagem e o sentimento nacional.
Ralph Waldo Emerson afirmou: “A história não é uma montanha de ossos. A história é uma corrente de pensamentos que passa através de todos nós.” No entanto, muitas vezes dedicamos mais devoção às estátuas de figuras estrangeiras do que às nossas próprias figuras históricas e heróis. Langston Hughes escreveu: “Eu sou o que sou e o que sou é tudo que eu sou.” Isso levanta a questão crucial sobre o verdadeiro orgulho de ser cabo-verdiano. Será que ainda somos um pouco dependentes do gosto cultural metropolitano, ou realmente sofremos o efeito de ser o kodé da humanidade? O amor pela nossa terra e herança é apenas uma sombra do que poderia ser? Georg W. F. Hegel disse: “A verdade é o todo.” Talvez a verdade de nossa identidade nacional resida na integração completa de nossa história, cultura e ambições, em vez de uma simples coleção de símbolos externos.
É estranho, mas essa perceção perpetua a ideia de que, mesmo em nosso próprio país, as estátuas e bustos de nossas figuras históricas são muitas vezes ignorados, usados para fins efémeros. Wole Soyinka observou: “O homem é o único animal que deve estar sempre a reinventar-se.” O silêncio de nossos bustos, frequentemente ignorado, deveria ser um convite para contemplação e orgulho, mas muitas vezes é um lembrete de que ainda temos muito a fazer para valorizar verdadeiramente nossa herança. Os monumentos não são apenas pedras e bronze, mas um reflexo de nossa própria consciência coletiva.mas as aves e os pombos contemplam melhores esses monumentos do que os homens da terra.
Portanto, é hora de repensar a maneira como homenageamos nossos heróis e celebramos nossa identidade nacional. Devemos ir além da simples construção de estátuas; precisamos cultivar um orgulho que se reflita em nossas ações e na forma como vivemos. Só assim poderemos transformar cada monumento em um verdadeiro símbolo de nosso orgulho e conquistas, e não apenas em um espaço para aves se acomodarem. Ben Okri afirmou: “A esperança é o combustível da vida. Sem ela, tudo o que fazemos é um movimento circular.” Com esperança, memória e determinação, devemos honrar nossas figuras históricas e construir um futuro que nos encha de orgulho.
No final, o desafio é transformar a beleza das estátuas e bustos talvez as silhuetas em uma fonte de verdadeiro orgulho nacional, sobretudo aqueles que fizeram desta nação um país digno com as suas criações e lutas, é um caminho a percorrer na igual medida que ainda temos uma geração antiga que idolatra as figuras nas praças e ruas de um tempo antigo e colonial, muitos têm um grande orgulho mas não as nossas não, mas é possível, onde cada monumento testemunhe não apenas o passado, mas também as aspirações e conquistas do presente. Como Jean-Paul Sartre afirmou: “A existência precede a essência.” A essência de nosso orgulho nacional será definida pela forma como escolhemos viver e celebrar nossa história, e não apenas pelos símbolos que erguemos. Penso eu de que, dito pelo portista do bairro de Mangui Baxu.
Mario Loff
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