Princezito transita com uma leveza de navegante entre os mares da música e da literatura
Princezito, o rasgador do céu e irrigador da terra!
Em cada palavra, um ruído do passado se entrelaça com o vindoiro. Os magos, seres solitários e incompreendidos quando o tópico é mais distante, carregam a sabedoria de um céu oculto que alguns sabem rasgar nas noites de pesarosas putas, um conhecimento tão profundo que escapa das mãos humanas. Suas palavras não são doces melodias de consolo, mas tempestades de revolução, conduzem os corações à busca incansável por uma suavidade divina, que se esconde nas sombras do universo. O vento, aquele mensageiro invisível que sopra da terra distante, traz consigo o murmúrio dos indivíduos, que são mais do que simples forças naturais – são os suspiros dos deuses, os rumores do divino. Os lobos, com seu olhar penetrante e sua força primal, são os anjos caídos, os guias dessa sabedoria ancestral. E nós, homens e mulheres, somos lobos, condenados a caçar nas trevas do existir, imortais em nossa busca por algo além da vida comum, refletindo a luta eterna entre a luz e a escuridão. Assim nasce o poeta e a poesia – como uma chama que se acende na noite escura, como um homem-luz que se ergue do caos, filho daquele que se fez carne na cruz.
E na terra de Santiago, onde as ventosidades se confundem com os mares, e as pedras avitas sussurram segredos que se dissiparam na duração, uma alma se levanta, como uma torre, como um farol, a iluminar o caminho tortuoso da humanidade. Ele não é apenas um homem. Ele é a fama do seu tempo, o pulsar de uma terra que nunca se esqueceu, que não se rende ao esquecimento. Carlos Alberto Sousa Mendes, o Príncipe da Palavra, é o reflexo de um Cabo Verde que jamais se cansa de cantar, de gritar, de lembrar. Sua voz é a extensão das marés que tocam as costas e das pedras que sustentam o peso do mundo. Como uma árvore cujas raízes mergulham nas profundezas do solo sagrado, esculpida pelas marés, sua arte é um tronco que resiste ao desgaste do tempo, como um testemunho das tradições que começam a se dissipar, mas que ele, imune ao esquecimento, mantém vivas na memória de seu povo.
Nas palavras de Carlos Alberto, brota o Finason, o canto-poema que desafia a morte e que, como uma chama vacilante, persiste, apesar da distância da última voz que o canta. Princezito não é só um artista; ele é o guardião de um tesouro imaterial, um alchemist da cultura que sabe que, ao abraçar o passado, se alcança a eternidade como tinha dito o Picasso. Sua arte, como uma magia silenciosa, sela um pacto com o tempo, tecendo a memória das gerações passadas como a de Bibinha Cabral e projetando-a para um futuro sem fim. Em cada canção, ele carrega a alma de Cabo Verde, imortalizando-a, semeando-a nos campos distantes como tem sido em variadíssimos palcos, onde a cultura florescerá além das fronteiras do tempo e da lembrança.
Em seu livro, Manual di Mudjer, a mulher não é mera musa, mas a força primígena que sustenta o mundo. Na obra, ele a exalta como a essência da revolução silenciosa que pulsa no coração da humanidade. O seu é um grito de resistência, uma reverência profunda àquela que, sem alarde, move as montanhas da existência. Mas Manual di Mudjer é um manifesto, uma convocação à reverência a essência do renascimento do mundo.
Princezito transita com uma leveza de navegante entre os mares da música e da literatura, como se a poesia e a melodia fossem apenas fragmentos de uma única canção que nunca deixa de repercutir-se. Cada uma de suas canções, como Spiga (2008) e Antigu Pensamentu (2015), traduz sua alma, o amor ardente por sua terra, por seu povo e pela história que carrega em seus ossos. Mas ele não se limita aos palcos; ele é um criador de vida, um coautor de projetos como o Festival do Milho e o Oru Femia, Princezito sabe que a palavra é mais do que um instrumento de comunicação. Para ele, é uma semente lançada ao vento, uma centelha de transformação. "As palavras são sementes", diz ele, ressoando a sabedoria de Bob Marley, que acreditava que uma boa música nunca envelhece. Como sementes levadas pelo vento, suas palavras encontram solo fértil nos corações daqueles que ainda têm ouvidos para escutar, olhos para ver e almas para sentir.
E, embora profundamente enraizado em Cabo Verde, Princezito é também um homem do mundo. Suas viagens por Cuba, Brasil e Porto Velho no brasil, são reflexos de um diálogo cultural constante, onde a música e as palavras se tornam pontes que unem o local ao global, o presente ao passado. Ele, como Gilberto Gil, acredita que a música, quando verdadeira, é universal e capaz de transformar não apenas as pessoas, mas as próprias estruturas que as cercam.
Com Manual di Mudjer, Princezito não homenageia apenas as mulheres de Cabo Verde, mas todas as mulheres do mundo. Ele, como Nina Simone, entende que a arte tem a responsabilidade de refletir a época em que vive, e sua obra ilumina as lutas e as vitórias, as dores e as alegrias das mulheres. Para ele, como para Miriam Makeba, a cultura é a alma de um povo, e ele se recusa a deixar que essa alma se apague. Com sua arte, ele escreve, canta e fala, deixando um legado imortal – a certeza de que a cultura, quando bem alimentada, resiste ao tempo e à escuridão. E, como ele diz, “sou rico em palavras”, palavras que são sementes espalhadas pelo vento, com o poder mágico de florescer nas mais inesperadas paisagens, renovando o mundo, um verso de cada vez.
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