eu não me identifico com essa historia de “Heróis do Mar”
Embora nascida e criada em Portugal
JÉSSICA SILVA RECUSA SER PORTUGUESA
Como filha de imigrantes cabo-verdianos de primeira geração nascida em Portugal ela podia ser considerada luso-cabo-verdiana ou afro-portuguesa se assim quisesse , mas para Jéssica Silva a reivindicação de uma dupla identidade não é nem nunca será uma opção... É desde Londres, onde esta a cursar “Estudos Africanos, essa jovem de 22 anos renega a “portugalidade” e assume-se como 100 por cento cabo-verdiana. E explica :
“Eu nasci e cresci até aos 13 anos de idade em Prior Velho, um bairro-de-lata do concelho de Loures, distrito de Lisboa, que foi destruído em 2019/2010... Cresci na zona mais pobre desse bairro que os portugueses chamam “ghetto” mas apesar de todos os problemas de droga e criminalidade ali eu era feliz. Embora meus pais nao fossem ricos ( e não são) nunca fomos para a cama com fome e até de ves em quando íamos aCabo Verde matar saudade.
A maioria das pessoas que viviam nessa zona dita “problemática “ de Prior Velho era cabo- verdiana ou de descendéncia cabo-verdiana, mas tambem havia angolanos, guinenses para alem de cidadãos de outros paises de expressao portuguesa... Havia também portugueses brancos ( poucos) e é por isso que eu digo que nasci dentro de uma das inumeras pequenas Africas que há em Portugal. ...No meu bairro se conheciam, havia aquele sentido de união e de cumunidade, havia aquela entre-ajuda... Lá tinha muitos amigos e amigas que eu considerava parte da minha familia e quando o bairro foi demolido confesso que chorei/ ..Chorei muito. Em Prior Velho viviam centenas de pessoas que de repente ficaram sem teto, mas isso o governo nunca disse nem nunca dirá.
NUNCA FUI TOTALMENTE ACEITE COMO PORTUGUESA
Me perguntaram vezes sem conta de onde eu vim, ouvi demais os portugueses brancos a me mandarem pra minha terra, que Portugal não me pertencia ...De facto nunca aceitaram que também houvesse portugueses pretos... Portugueses pretos só são aceites por portugueses brancos quando positivamente representam Portugal. É o que acontece com os futebolistas famosos, mas mesmo assim são criticados.
Portugal continua a ser uma sociedade institucionalmente racista, e nós os pretos somos descriminados no dia-a-dia em todas as áreas, desde educação ao sistema judicial passando pela violência policial... O racismo está tão bem infiltrado e camuflado na sociedade portuguesa que alguns pretos nem se quer se dão conta de que são vitimas do racismo. Alguns vão a televisão dizer que não há racismo em Portugal, o que é absolutamente absurdo.
COMO PODERIA ACEITAR TAL IDENTIDADE?
Não...
Eu não me identifico com essa cultura de racismo e de segregação, da mesma forma que eu não me identifico com essa historia de “Heróis do Mar” que fez de Portugal a primeira nação do mundo a escravizar, a assassinar, a colonizar, a explorar e a violar meus antepassados. Tudo isso me dá nojo, me entristece.
Como é que eu poderia reivindicar tal identidade? Só pelo facto de estar estampada no meu certidão de nascimento?
Pelo facto de os portugueses não reconhecer as atrocidades que cometeram em África e contra os africanos...Pelo facto de glorificarem a “Era dos Descobrimentos” que foi de facto um encobrimento ...Pelo facto de não ensinarem nas escolas e ocultarem da história as atrocidades que no passado cometeram...Pelo facto de transmitirem a ideia de que a colonização foi benéfica para os africanos que pelo facto até deviam estar agradecidos... É por tudo isso e por muito mais que eu não me sinto “Portuguesa”, mas é também pela minha herança cultural que fez de mim CABO-VERDIANA.
Tive a sorte de crescer no seio da minha comunidade onde nossa cultura nossa “tradison di terra” eram praticadas todos os dias através da fala, da musica, da dança, da comida, dos valores...É essa cultura, essa tradição e esses valores finalmente fizeram de mim o que eu sou é que reivindico e que qye farei qustao de trasmitr.
Sou e sempre serei cabo-verdiana.
- Jéssica Silva ( Londres), fonte:ok
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