Por acaso sabem quanto custa uma oportunidade para quem nasceu nestas ilhas de muita escassez?
NOTA DE ESCLARECIMENTO.
Havana? Cuba? Não foi desta vez!
Fui convidado a representar Cabo Verde no Áse Poetry Slam, primeiro Campeonato Cubano de Poesia Falada de 12 a 15 de Abril, em Havana, Cuba, como membro do corpo de jurados da competição e como performer (convidado). Caso fosse possível a minha participação, seria o único convidado da lusofonia e o único de todo o continente africano nesta edição do evento.
Todo o processo foi um bocado caótico, do inicio ao fim, com a excepção de tudo o que dependia de Cuba e da organização.
Assim que recebi o convite, comecei a enviar cartas de solicitação de financiamento a várias instituições publicas e privadas do país.
Foram muitos "nãos" e muitas cartas e emails sem resposta. Finalmente tive respostas positivas de 3 instituições, com a promessa que iriam financiar a minha deslocação para Cuba e estadia durante 5 dias em Havana. O Banco Interatlântico, a Câmara Municipal de Santa Catarina e a Câmara Municipal da Praia que prometeu financiar a 100% do valor da fatura pró-forma da passagem.
Das 3 instituições o Banco Interatlântico foi a única que disponibilizou o valor imediatamente, enquanto que a Câmara Municipal de Santa Catarina fez o depósito do valor combinado na minha conta no dia 5 de Abril e a Câmara Municipal da Praia só disponibilizou o valor prometido no dia previsto para a viagem, 11 de Abril.
Só depois de ter a confirmação de financiamento de pelo menos 100% do valor das passagens poderia então tratar dos processos consulares.
Fiz uso de parte do valor disponibilizado pelo BI para tratar todo o processo do visto de Cuba.
Depois de ter o visto cubano comecei a tratar dos processos para o visto Schegen de curta duração, pois, como tinha que fazer escala em Lisboa tanto na ida como na volta, decidi aproveitar a viagem para passar alguns dias em Portugal logo após o regresso de Cuba no dia 17 de Abril. Inclusive o grupo no qual a empresa onde trabalho faz parte, convidou-me formalmente para uma formação em Marketing Digital e Vendas a ter início no dia 20 de Abril, com o término previsto para o dia 10 de Maio. O processo do visto europeu foi suportado totalmente por mim com o meu próprio dinheiro.
Tendo em conta a urgência da minha situação, enviei um email ao Centro Comum de Vistos, através do serviço Balcão Azul, a explicar detalhadamente todo o processo e a solicitar um agendamento com máxima urgência.
O CCV respondeu o meu email a propor o agendamento do meu pedido de visto para o dia 11 de Abril. Tão rápido quanto recebi a resposta, enviei em sequência um email a explicar mais um vez a urgência da minha solicitação e que a minha viagem para Havana estava agendada para o dia 11, no mesmo dia em que propuseram o meu agendamento. Solicitei então, caso fosse possível, uma antecipação do meu agendamento para a quinta-feira, dia 6 de Abril (sendo que quinta-feira a partir do meio dia e sexta-feira, o dia inteiro eram dias feriados), ou então para o dia 10, segunda-feira. Mas não sendo possível a antecipação, que me dessem a garantia que eu teria uma resposta no dia 11 no período da manhã. Novamente responderam a minha solicitação, a propor a antecipação do meu agendamento para o dia 10 pelas 10:00.
No dia 10 de Abril, às 10:00, fui entregar os meus documentos, conforme o agendamento, e de novo, redundantemente, expliquei a urgência do meu pedido. Disseram que podia passar no dia seguinte, 11 de Abril, às 14:00 para levantar o passaporte com o visto europeu.
No dia 11 às 14:00 fui buscar o meu passaporte, fizeram-me esperar quase 2 horas, e quando fui atendido disseram que não seria possível entregar-me o passaporte com o visto no dia e nem no dia seguinte e que teria que esperar pelo menos 5 a 10 dias. Em modo repetição, expliquei de novo e de novo a urgência da minha solicitação, pois, se eu não tivesse o visto no dia 11 ou pelo menos no dia 12, teria que levantar o passaporte mesmo sem o visto europeu porque o evento em Havana termina no dia 16 e eu tinha que viajar no dia 11. Mas insistentemente recusaram agilizar o meu processo. Não tive escolha, escrevi (à mão) uma carta a pedir o cancelamento da solicitação de visto e levantei o meu passaporte.
Assim que saí das instalações do CCV liguei para a agência a solicitar a emissão das passagens. O itinerário mais acessível era Praia - Lisboa - Madrid - Havana - Madrid - Casablanca - Praia, no valor de 223.300 ECV. Comprei imediatamente, pois, corria o risco de não encontrar mais passagens disponíveis.
Sentia frustrado mas ao mesmo tempo aliviado, pois, apesar de não ser possível a minha entrada na europa, tinha pelo menos garantido a minha viagem para Havana. Mas como já dizia o sábio, o mal nunca vem só! A grande frustração foi no aeroporto, no momento do check in, a poucas horas da viagem, quando disseram que eu não podia fazer duas escalas em território europeu sem visto SCHENGEN e que sendo assim, não poderia viajar. Afinal o visto schengen no passaporte era uma questão "sine qua non" para a minha viagem para Cuba, tendo em conta que não existe nenhum voo direto de Lisboa - Havana - Lisboa, os únicos itinerários possíveis eram Praia - Lisboa - Madrid - Havana ou Praia - Lisboa - USA (2 aeroportos) - Havana. O itinerário de ida da passagem que comprei foi Praia - Lisboa - Madrid - Havana, o que significa que teria que fazer escala em dois países do território europeu e para isso teria que ter um visto Schengen de curta duração ou pelo menos um visto de trânsito.
A única alternativa era alterar a viagem Praia - Lisboa (TAP) para dia 12 (madrugada do dia 13) - 21.000$00 e comprar novas passagens de Lisboa - Madrid - Havana e arriscar em mais uma missão impossível de aceder aos serviços do CCV sem marcação prévia e tentar transpor as muralhas de concreto e os super guardas e chegar até os intocáveis e ver se conseguia amolecer os corações de maquinas humanas que lá trabalham. Mas no final decidi não gastar mais um centavo, mais energia e nem mais tempo com este processo. E mais uma oportunidade foi perdida por causa da burocracia e da insensibilidade das instituições em Cabo Verde.
Perdi ao longo de todo o processo mais de 2.500 euros, só a passagem custou quase 2.300 euros, sem previsão de reembolso por enquanto. Neste momento estou a ver com agência a possibilidade de recuperar algum valor.
Escrevo este post para dar explicações relativamente a todo este processo e prestar esclarecimento do uso do valor que recebi da parte dos financiadores. Estou disponível para apresentar todo o relatório deste processo caso for necessário.
Aos burocratas deste país, pergunto:
Por acaso sabem quanto custa uma oportunidade para quem nasceu nestas ilhas de muita escassez? Principalmente quando é-se declaradamente neutro de cores e símbolos partidários? Por acaso sabem quantas vezes não tirei do meu próprio bolso aquilo que eu não tenho e do meu tempo aquilo que não sobra para criar oportunidades para mim e muitos jovens como eu?
Provavelmente não.
Provavelmente nem vão ler este post, mas está tudo bem, de qualquer maneira nunca lêem.
Obrigado Luz De Cuba Àṣẹ Poetry Slam pelo convite, pelo reconhecimento e pela grande oportunidade.
Obrigado Câmara Municipal da Praia Câmara Municipal de Santa Catarina Banco Interatlântico pela confiança e pelo apoio.
Obrigado Spoken WORDS cabo verde por tudo.
Tamos Juntos!
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