Dimundu & os seus ofícios
Quem é o “Dimundo”
Literalmente, "Dimundu" na nossa língua materna é sinonimo de "Do mundo". (Mediku di mundu). Alcunha que "docter" escolheu para expandir a sua arte de "curar ". (Reparação de fogoes) . De apito à boca, chapéu de aba grande à cabeça, sai da casa de manhã à procura de algum enfermo, quer no inverno e quer no verã, quer na chuva ou quer no sol, os "enfermos" estão à espera, o velho "docter" so regressa à casa à tarde depois de um intenso dia de "consultas" percorrendo ladeiras e achadas, vilas e cidades, muitas vezes dezenas de quilómetros afastados da sua morada ganhando assim o seu merecido pão de cada dia.
Gaudêncio de Pina, seu nome de baptismo. Simples, dinâmico, aventureiro, afável, dialogante, pacífico e brincalhão, de voz timbrada mas não canta, e nem toca, mas, encanta a todos com a sua boa disposição.
Gaudêncio de Pina, (Denxinhu) também é conhecido por “Txadinha” por alguns. “Txadinha” esse estranho epíteto resultou na sequência de uma desavença com uma ex-companheira que terminou de forma pacifica e cheia de piada. Vamos falar disto um pouco mais abaixo.
"Dimundu" nasceu no seio de uma humilde família: José Paulo de Pina e de Jesuína Mendes. Último filho no grupo de 5, todos já falecidos. Passou toda a sua infância e adolescência em Ponta Verde da freguesia de São Miguel lugar onde nascera a 25 de Abril de 1937. Não frequentou os banquinhos da escola mas, muito cedo conheceu o mundo do trabalho e tão cedo também se lançou no mundo de aventuras fora do seu torrão natal.
Aventura para Angola
Em 1957, na casa dos 20 anos de idade aventura-se para Angola como contratado à procura de uma vida melhor. Chega a Angola e instala-se em Lobito com os respectivos alojamentos. Trabalha numa fábrica de açúcar até ao seu regresso a Cabo Verde em 1964.
Aventura para a ilha do Príncipe
Em 1966, inconformado com a situação em Cabo Verde, na perspectiva de encontrar um novo horizonte embarca para a ilha do Príncipe como contratado. Ali, permanece por 3 anos conforme o estipulado no contrato. Volta à terra de origem no ano de 1969 e pára uns escassos 2 anos.
Nova aventura
Em 1971, ruma-se para o mesmo arquipélago mas, o Destino desta feita, traçara à ilha São Tome e instala-se na Roça São Luís, com um contrato assinado de novo por 3 anos.
De São Tomé para Portugal
Ver para crer. Decorria o histórico ano de 1974, o “Ano da Revolução Portuguesa” viaja então de São Tome para Portugal. Viu, acreditou e testemunhou que em Portugal não corre realmente leite e mel como muitos imaginam e, como ele próprio provavelmente imaginava, tanto é certo não demorou por aí mais que uns escassos três meses devido à falta de trabalho e outras situações, nomeadamente: clima, língua, ambiente etc.
Regresso à terra-natal.
Chega a Cabo Verde nos meados de 1974/75, quase na altura da independência. Escasseavam os trabalhos, mas, conseguiu sobreviver graças à sua arte que aprendera com um português numa oficina mecânica em Angola.
Para não viver só viu-se por necessidade ter uma companheira. Companheira essa que viria lhe causar muitas dores de cabeça. Este romance terminou de forma abrupta e anedótica.
Conta assim: “nu fazi nos kaza djuntadu, kariz pa kubriba kaza era di si lugar, as tantas, nu bira go, ka ta fila dentu kaza, diskutison ta bai diskutison ta ben. Meza rapartidu, kama rapartidu. Di kaza e fla me ka ta sai. E ba kexa di mi na postu pulisia ma N sta kori kol di kaza, pulisia toma si kexa na brinkadera e flal: Nha dal “txadinha” e ta dexa nha na kaza, e rispondi na mesmu ton: “txadinha” N ka ta dal. Pulisia torna flal: Si nha ka sta dal “txadinha” nha ki ta sai”.
Com esta “imposição” da polícia optou-se ela por abandonar o lar. Desta sorte, o “Dimundu” ganhou a razão e, ganhou então a popularizada alcunha de “TXADINHA”.
A mulherzinha levou consigo a sua "txadinha" e ficou apenas o nome em casa. Enfim, um romance com um final feliz, e, com muita graça. Coisas da vida! Afora isto, garante que nunca teve implicações com ninguém mesmo nos momentos mais complicados da sua vida fora da sua terra natal. Realça: “;Mi Nta rispeta tudu algen i tudu algen ta rispetan.”
“Txadinha” como era ainda um homem novo e cheio de vigor arranjou uma nova companheira com quem acabou mais tarde por se casar e esta “brindou-lhe:” 6 filhos: 3 rapazes e 3 raparigas. Hoje, é avô de alguns netos.
Tarrafal, 25 de Abril de 2020
Nataniel Vicente Barbosa e Silva
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