uma jovem mulher que escapou da morte.
Sob a Sombra da Ameaça: A Luta de uma Mulher pela Sobrevivência
A figura que se aproxima é uma jovem mulher que escapou da morte. Quando começou a namorar, seu pai apontou-lhe a porta, indicando a vida lá fora. Ela partiu e nunca mais foi convidada a voltar. Em nossa casa, são os filhos que trazem visitas. Fragilizada na casa dos parentes, um dia foi abordada por um homem atraente, num encontro casual, num desses dias em que se toma umas Coca-Colas, dias de alegria temporária, mas também de dores de nove meses, e ela se sentiu magnética, ele encantador. Depois veio o conforto, a confiança, a amizade, o namoro e, por fim, o filho.
Ela é uma mulher negra, evocando os versos de José Craveirinha: "Sou carvão, patrão, sou alcatrão, patrão."
Negra em todos os sentidos, lembrança de um baobá que morreu dentro dela, e suas tranças extravagantes, ainda presas, parecem prontas para uma última dança, embora o momento não seja para dançar, mas sim para fugir das balas. Ela é bela. Ela é como carvão, capaz de incendiar corações.
Ela é negra, sua presença intimida, e ninguém imagina que essa figura aparentemente insignificante já foi alvejada pelo antigo companheiro.
É natural que os homens notem seus atributos. Ela é linda, dizem os homens, como o Comandante Jesuíno, numa frase que serve para ela, dita pelo Altino ao Jesuíno. A bala não disparou, mas a arma esteve apontada para ela, travada talvez pela mão invisível de Deus.
- Se não for eu, não será nenhum outro homem.
A justiça sofre de uma séria falha, sou demasiado tolo para entender essas coisas da lei. O rapaz, ex-marido e pai do menino, tem a ficha limpa, mas agora é um touro solto.
A mulher está assustada, conversando com um dos funcionários da justiça. Ouço atentamente.
- Ele vai me matar, ele atirou em mim.
Ela termina, consciente e constantemente observando as curvas da estrada, os becos, as portas dos bares, as filas diante dos prédios públicos e privados, os táxis que param e deixam alguém sair, ela rapidamente os analisa.
- Ufa, não é ele. Mais um susto superado.
Ela é linda e assustada. É compreensível que um homem possessivo não aceite perder uma joia como ela. Provavelmente, ele a imagina nas mãos de outro homem, explorando-a até o fim do amor, uma oportunidade que sempre traz a esperança de um novo começo, e isso o enche de raiva e pressa para destruir a imagem majestosa da mulher que não pode ser tocada ou possuída nem por Deus nem pelos mortais; só a terra pode consumi-la, aliviando a raiva, o desejo sexual e a narrativa sexualizada construída em torno da masculinidade.
Como é fácil. Ter a certeza de que ela é minha, que posso descarregar meus pecados nela e que o que vier depois terá o valor que tiver. Mas, nela, nenhum homem toca. Ela é minha, e só minha. Também ganhei o direito de tê-la e de matá-la.
Essa mulher nasce a cada madrugada e se move entre as hienas, trabalhadora, mãe em risco de vida. É fácil admirar seus atributos, mas ela está apavorada, e o medo a faz esquecer que é mulher; o batom perdeu seu brilho. É sangue.
As autoridades afirmam que só podem prender o rapaz em flagrante delito. Mas onde está o delito? No estado?
A funcionária já fez muito por ela desde os tempos do colégio, mas agora sente que está nas mãos da justiça e não pode intervir. Se amanhã ela aparecer morta, pelo menos alguém tentou. A justiça matou.
por: Mario Loff
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